Search
Close this search box.

O “logos”

A palavra talvez seja o dom mais precioso do homem. Um instrumento que não vale por si só, como uma pura e simples combinação de fonemas. Vale pelo pensamento que expressa ou tenta expressar. A palavra acompanha o homem desde o seu surgimento, como um instrumento primordial para comunicar as suas emoções.

Antes do homem, precedendo-o no tempo, já era o “logos”, identificado com o Criador. E o homem se apropriou desse “logos”, reconstruiu-o à sua maneira e o fez uma extensão de si próprio.

Mas um instrumento assim, tão poderoso, não poderia deixar de se contaminar pelas vicissitudes humanas e expressar, às vezes, a mentira e o engodo dos demagogos ou o ódio e a intolerância dos autoritários.

Mas o “logos” humano se presta a outras muitas utilidades e, na era da comunicação digital, da exaustão informativa das redes sociais, estamos vendo coisas incríveis no universo dos “WhatsApps”. Agora, por exemplo, estamos vivendo o momento das mensagens pseudo-edificantes, às vezes de fundo religioso, às vezes de fundo filosófico. É uma enxurrada delas. As fontes são as mais diversas possíveis e, se o caboclo não tem certeza, coloca a frase na boca de qualquer um que lhe possa dar credibilidade. O Papa Francisco tem sido o autor da grande maioria das mensagens. Há quem já o chame até de “Papa Chico”, na intimidade. Mas vemos mensagens de Nietzsche, de Santo Agostinho, de psiquiatras, psicólogos, entremeando-se a mensagens de humor (na maioria das vezes sem graça) e, é claro, as de fundo erótico. De qualquer modo, já está difícil manter aquilo tudo na memória do aparelhinho.

Então, passei a ser seletivo. Deleto diariamente quase que a totalidade das mensagens e fotos, até para facilitar o acesso ao que de fato me interessa no meu WhatsApp. Procuro usar o sistema como uma ferramenta útil, até para divertir-me. Não confio em mensagens de autoria duvidosa e elimino de cara aqueles “lugares comuns” de autoajuda e cultivo um hábito ao manusear o WhatsApp: jamais leio os textos que tenham mais de dois dedos de extensão. Chega um momento em nossa vida que a idade já nos subtraiu o tempo e a paciência necessários para ler mensagens longas. Afinal, elas nos dizem sempre aquilo que já sabemos.

Eu gosto das palavras, gosto de trabalhar com elas, fazê-las de tijolos para construir os meus castelos de fantasia. Não trocaria todas as telas de computadores do mundo e os seus maravilhosos e inesgotáveis recursos pelos livros que tenho em minha biblioteca. Quantas vezes já percorri aquelas milhares de páginas daquelas centenas de autores. Mas, a cada vez que as leio, encontro sempre coisas novas. As obras mudaram? Não! Sou eu que mudo a cada dia e leio essas coisas com um novo entendimento. Assim, as obras que eu tenho em minhas estantes se multiplicam, pois me trazem sempre uma mensagem nova a cada vez que eu as revisito.

Por isso, eu acho o WhatsApp pobre e o uso apenas funcionalmente. Para as minhas emoções, eu fico mesmo com as páginas já amareladas dos meus velhos livros…

Deixe um comentário

Outras Notícias