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Oftalmologistas do Calçadão

Há muitos anos, antes das fiscalizações dos Conselhos que autorizavam o exercício das profissões, existiam os chamados “práticos”, pessoas que aprendiam ao lado de outro profissional durante algum tempo e depois tornavam-se profissionais na área. Assim, tínhamos os “Farmacêuticos Práticos”, muitos deles, ou a maioria, com grande conhecimento e experiência na área. Além de conhecedores das drogas manipuladas e exímios “decodificadores” das letras dos médicos para entenderem os complicados nomes dos componentes químicos dos remédios que iam manipular, possuíam um profundo conhecimento dos remédios da flora, fabricados com folhas e raízes de diversas plantas. Os Farmacêuticos Práticos, principalmente nos pequenos lugarejos de parcos recursos médicos, assumiam muitas vezes as funções de parteiros para aquelas mulheres simples que, àquela época, pariam os seus filhos em sua própria casa. Os Farmacêuticos, tanto os práticos como os formados em bancos de Universidades, receitavam até óculos. Lembro-me da “Pharmácia Paschoal”, do Sr. Bernardino (formado em Faculdade), com o seu balcão repleto de óculos com lentes de diversos graus. O cliente ia experimentando um a um, até encontrar aquele que lhe proporcionasse uma visão mais nítida das letras que eram postas à sua frente. Esses Farmacêuticos costumavam ser, como os padres locais, os pontos de apoio das comunidades em que viviam. Por isso muitos deles foram expressivos líderes políticos locais.

Paralelamente existiam também os “Dentistas Práticos” que, após aprenderem o ofício por algum tempo, exerciam a sua profissão, tanto em consultórios fixos, como atuando como profissionais ambulantes, percorrendo fazendas e lugarejos com o seu limitado equipamento (normalmente espátulas, pinças e boticões, pois não se usava anestesia), atendendo os seus clientes. O nosso Tiradentes, por exemplo, foi um desses práticos, embora tenha ficado na história como o protomártir da nossa Independência.

Existiam também as “Professoras Leigas”, sem diplomação para o cargo mas com o conhecimento necessário para transmitir conhecimentos naquelas escolas rurais tão carentes de professores. Algumas, meigas e pacientes com os alunos, outras, com a pedagogia da régua grossa no lombo ou a temível palmatória, que não tive o desprazer de conhecer ou experimentar. Das “reguadas” tenho boas lembranças…

Mas eu queria falar mesmo era dos “Oftalmologistas do Calçadão”. Os que citei atrás foram frutos do tempo, de uma época em que, existindo poucos centros de formação, esses profissionais cumpriam um relevante papel nas comunidades carentes daquelas profissões. Muitos deixaram o seu nome na memória das cidades ou comunidades em que viveram graças aos bons serviços que prestaram. Mas o que causa espanto é a gente ver nos dias atuais, nos calçadões de cidades maiores, aqueles “oftalmologistas” com uma banca repleta de óculos com lentes dos mais variados graus e as pessoas “experimentando” à procura daquele que lhe proporcione uma melhor visão. A desculpa é que as pessoas têm interesse apenas nas armações, que ficariam hipoteticamente mais em conta do que uma armação de marca em uma Ótica. Mas o fato é que muitas pessoas acabam usando mesmo aqueles óculos, desconhecendo se o grau da lente que necessita é aquele mesmo ou, principalmente, se é o mesmo para cada um dos seus olhos. É uma pena que ainda seja permitida a venda de óculos de grau em bancas de rua sem uma fiscalização do órgão competente.

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