O sorriso do cavalo
Ariosvaldo sempre foi um eterno sonhador em acertar uma bolada na Loteria. A cada vez que jogava e eram duas por semana, arquitetava seus planos. Como não ganhava, seu sonho era sempre adiado. Uma hora era uma espaçosa casa na praia com uma boa churrasqueira ou, quem sabe, uma pequena propriedade rural, apenas o mínimo para umas galinhas das boas, com ovos frescos todo dia. Ah, não esquecendo da casa na cidade com garagem para quatro ou cinco carros, uma ampla piscina e uma área com uma ampla e moderna churrasqueira para “queimar”, nos fins de semana, uma carninha com os amigos.
Em viagens para fora do país ele pensava às vezes, mas preferia viajar por aqui mesmo, por esse imenso Brasil com tanta coisa bonita para se ver.
E Ariosvaldo jogava a cada semana as suas esperanças. Uma vez era na Mega-sena, outra na Quina, às vezes na Lotomania e em tantas outras que surgissem. O tempo passava e nada de Ariosvaldo acertar na mosca. Costumava passar perto, o que lhe alimentava o ânimo para continuar apostando na sorte. Jorcélia, sua mulher, buzinava em seu ouvido o tempo todo:
– Ô Ariosvaldo, se você juntasse esse dinheiro do jogo dava pra gente alugar uma casinha na praia no fim do ano. Em Atafona mesmo já estaria bom…!
Foi aí que, de tanto esperar e de tanto escutar as reclamações da mulher, ele resolveu não jogar mais. Quando passava à porta de uma Casa Lotérica sentia até um friozinho na barriga, mas dominava a vontade e desviava o pensamento para outras coisas boas que a vida tem.
Uma noite, já esquecido do tormento das apostas, Ariosvaldo teve um sonho. Sonhou que estava à janela da sua casa, em uma manhã bonita e ensolarada, quando veio pela rua um cavalo branco como a neve, em uma marcha firme e compassada. Ninguém o montava, apesar de estar equipado com uma luxuosa montaria de apetrechos em prata. O cavalo parou em frente a sua janela e disse para o Ariosvaldo:
– O dia está bonito, vamos dar uma volta?
Na cela do bonito cavalo apareciam seis números prateados. Ariosvaldo ficou estático debruçado à janela. O cavalo, com um sorriso amplo e nada comum a um equino, foi se afastando da janela. Quando Ariosvaldo já se preparava para pular para a calçada e montar o belo corcel, sentiu um puxão pelo braço e a voz da mulher que o acordava:
– São sete horas, vai trabalhar hoje não?
Ariosvaldo pulou rápido da cama, alegre como nunca acordara antes. Correu à sala, ainda de pijamas, pegou uma caneta e escreveu depressa na palma da mão mesmo os seis números do sonho, antes que os esquecesse.
À hora do almoço, antes mesmo de comer sua marmita, foi à Casa Lotérica próxima ao seu trabalho e fez a aposta. De quebra, para não perder o embalo, foi até à esquina e jogou cem reais no cavalo. Era uma quarta-feira e já passava das dezoito horas quando chegou em casa. Sua mulher estranhou aquele ar alegre do marido, mas conteve-se.
À noite, Ariosvaldo foi conferir o seu jogo. Que surpresa…! Dos seis números jogados, não acertou nenhum. Pela manhã, como numa última esperança, foi até à esquina para conferir o jogo do bicho. Que cavalo que nada, havia dado Burro, na cabeça! Depois daquele dia Ariosvaldo nunca mais jogou. Já está pensando até em comprar o tal barraco em Atafona…