ALMG promove audiência pública em Belisário para discutir ameaça a frei Gilberto

Ameaçado de morte por sua liderança na mobilização contra a expansão da mineração na Serra do Brigadeiro, o frei Gilberto Teixeira da Silveira já foi incluído, em caráter emergencial, em um dos programas de proteção aos defensores de direitos humanos da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania.

A informação foi divulgada na noite de segunda-feira (26), durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada diante de centenas de moradores reunidos na sede do grupo de artesãos do distrito de Belisário, distante 33 quilômetros da sede de Muriaé, aos pés da Serra do Brigadeiro. Paraíso da biodiversidade, a Serra do Brigadeiro detém a segunda maior reserva de bauxita do país, essencial à produção de alumínio, o que desperta a cobiça dos grandes conglomerados minerários mundiais desde a década de 1980.

A audiência atendeu o requerimento do presidente da comissão, deputado Cristiano Silveira (PT), que lembrou o poder paralelo exercido pelas mineradoras em todas as esferas de poder. “Quando falamos de mineração em Minas, é o rabo que balança o cachorro, e não o contrário. São as mineradoras que atuam para ditar as regras desse mercado e, assim, fazerem o que bem entenderem”, lembra.

Cristiano Silveira elogiou a atuação do Executivo no episódio da ameaça ao frei. Essa proteção garantiu o acompanhamento do caso, no local, por uma equipe técnica, com o mapeamento de situações de risco e a instalação de um kit de proteção na comunidade. Isso inclui tanto vigilância eletrônica quanto sistema de comunicação a ser acionado em caso de nova ameaça que coloque a vida do religioso em perigo. Um dos pressupostos dessa atuação é garantir a segurança sem retirar o defensor de direitos humanos do seu local de atuação, justamente para não enfraquecer a luta.

O programa, que é articulado nacionalmente, também intervém para que o episódio mereça uma atenção especial por parte das forças policiais, tanto na proteção ao frei quanto na investigação do caso, conforme explicou a diretora de Proteção e Defesa de Direitos Humanos da Secretaria de Direitos Humanos, Ana Carolina Gusmão da Costa. “É inadmissível que um defensor de direitos humanos seja ameaçado”, resume.

SEGURANÇA E TRANSPARÊNCIA – Mas isso ainda não é suficiente, conforme relato dos participantes da audiência pública. Entre as reivindicações apresentadas, algumas são de simples solução, como a melhoria na infraestrutura da Polícia Militar da região, com a volta do destacamento ao distrito.

Contudo, outras reivindicações são mais difíceis, como a transformação de todo o entorno do Parque Estadual da Serra do Brigadeiro em área livre de mineração. Se isso depender da mobilização da comunidade, não será problema, já que a reunião foi interrompida várias vezes por gritos de “Mineração aqui não”.

MOBILIZAÇÃO – Uma apresentação musical do Movimento pela Soberania Popular na Mineração mostrou que até mesmo os adolescentes estão conscientes da importância da preservação dos recursos naturais da região. São filhos de agricultores cujas famílias vivem ali há gerações, praticantes da chamada agroecologia, que têm na produção de café e leite a base da economia, mas que já começam a explorar também o potencial turístico da região.

Recentemente, eles fizeram protesto semelhante em um evento da mineradora em Rosário da Limeira, município vizinho também situado ao pé da serra e também vem sendo assediado pela empresa.

POLÍCIA CIVIL JÁ TEM RETRATO FALADO DO SUSPEITO – Apesar de passados mais de quatro meses, o relato da ameaça sofrida pelo franciscano da Fraternidade Santa Maria dos Anjos e responsável pela Paróquia de Santo Antônio, em Belisário, ainda revolta os moradores do distrito. Após a celebração de uma missa em 19 de fevereiro deste ano, um homem armado teria invadido a casa paroquial. “Hoje é só um aviso. Você está falando demais sobre mineração e eu vim aqui dizer para você parar com isso”, afirma o desconhecido.

Este homem disse ainda que todos os passos e declarações do frei estavam sendo acompanhados. “Ele sabia de um encontro que realizamos na véspera. Disse que eu tinha até sido moderado, mesmo com a Campanha da Fraternidade (em defesa dos biomas), e relatou em detalhes por onde eu tinha passado e dormido nos últimos dias”, conta.

O estranho mandou o religioso ficar na casa paroquial e desapareceu sem deixar vestígios. Uma semana depois, o próprio religioso, que está em Belisário desde 2011, localizou uma testemunha que também viu o estranho e um retrato falado foi confeccionado pela Polícia Civil. Foi instaurado inquérito sobre o caso, que agora está em segredo de Justiça, motivo da ausência de um representante do Ministério Público na reunião.

INQUÉRITO – O titular da 32ª Delegacia de Polícia Civil, delegado Fábio Correia de Almeida, pediu o apoio da população em busca de mais informações que ajudem na identificação e prisão do suspeito. “Existem leis que protegem testemunhas. Ninguém vai ficar exposto. Já avançamos, mas para chegar à autoria precisamos da ajuda da comunidade”, afirma, sem dar mais detalhes.

Apesar de ninguém ter sido preso e da ameaça, que teve repercussão até no exterior, ter mudado sua rotina, frei Gilberto diz que o episódio deu mais força à causa. “A ameaça não foi ao frei, mas a todo mundo que está se posicionando contra a chegada da mineradora. A comunidade me acolheu e me protege. O dinheiro da mineração pode até solucionar alguns problemas imediatos, mas vai deixar outros ainda maiores e a população já entendeu isso. A água é um bem maior do que o minério”, defende.

Foto: Silvan Alves (www.silvanalves.com.br)

 

 

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