As trágicas e as doces mentiras
O fantasma da enchente do rio Muriaé é aquela assombração que amedronta o muriaeense todos os anos à época das águas. Uma preocupação que se inicia em novembro e se arrasta até às águas de março do ano seguinte. Cinco meses de apreensões e atenção aos serviços de previsão do tempo. As administrações municipais se sucedem e às vezes se repetem mas não resolvem o problema das enchentes.
As promessas de solução para o transbordamento do rio são sempre repetidas a cada campanha para eleição e o povo acredita porque faz parte da essência do povo acreditar, assim como faz parte da essência do político prometer.
Além desse binômio terrível de promessa e credulidade, existem os empecilhos coadjuvantes como a irresponsabilidade daqueles que diariamente despejam em nosso rio milhares de sacolas de lixo, descartes de móveis velhos e outros tantos entulhos e, ainda por cima, existe também o pseudo zelo dos órgãos ambientais que inviabilizam qualquer tentativa de dragagem ou operações semelhantes no leito do rio. Os planos de limpeza, alargamento em alguns pontos e urbanização do nosso rio no perímetro urbano, exibidos exaustivamente em excelente computação gráfica, ficaram apenas nas telas dos computadores e na mente dos crédulos eleitores/cidadãos. Acreditar faz mesmo parte do ser humano e foi justamente nesse terreno fértil da credulidade que vicejaram os demagogos. Apesar da sua origem grega, os demagogos já existiam desde a origem da humanidade. Até mesmo na história mítica de Adão e Eva, podemos constatar o ato demagógico da serpente.
Por estes dias, o nosso rio Muriaé tem subido e descido ao sabor das chuvas que aumentam ou diminuem no decorrer da semana. O leito do rio continua com obstruções maciças de acúmulo de terra, formando verdadeiras ilhas, com entulhos de toda espécie e com suas pontes com os pilares fincados em seu leito e construídas retas em vez de arqueadas, funcionando como verdadeiros obstáculos à correnteza do rio, refluindo-lhe as águas.
Quando se aproximar novamente a época das campanhas eleitorais ouviremos novamente as mesmas promessas de solução para os problemas do rio, até que venha outra enchente e os mesmos transtornos no espírito dos homens.
Mas os homens acostumam-se com as mentiras, por isso gostamos tanto do teatro, do cinema e das histórias que escutamos desde criança. A arte, como imitação da vida, é uma mentira que encanta e distrai a nossa alma. Às vezes costuma ser até um processo de catarse, como nas tragédias encenadas, em que colocamos para fora aquilo que nos incomoda por dentro. Existem mentiras… e mentiras e, a propósito, vou lhes contar um caso ou causo, como queiram:
Há quase cinquenta anos, quando me casei, fui passar a “lua-de-mel” no Rio de Janeiro. Éramos dois jovens que combinavam perfeitamente com a beleza e o encanto da Cidade Maravilhosa. Na manhã do primeiro dia fomos à praia de Copacabana desfrutar de suas finíssimas areias e do seu escaldante sol. Tudo seria perfeito se, envolvido por uma forte onda, bem ali em frente ao Posto Quatro, eu não tivesse perdido a minha aliança de casamento. Eu e minha esposa a procuramos, com a ajuda de outros banhistas, por toda parte. Esforço em vão. O remédio foi fazer outra quando voltamos a Muriaé. O tempo passou, restando apenas a lembrança daquela aliança dourada, perdida na manhã do primeiro dia.
Cinco anos depois, fomos passar uns dias em Guarapari e, na volta, como hábito de todo mineiro, trouxemos, congelados em isopor, camarões e peixes. Já em casa, quando abrimos aquela garoupa de quase oito quilos, qual foi a surpresa? Dentro dela, brilhando como no primeiro dia do casamento, a minha aliança, tendo em seu interior gravados o nome da minha esposa e a data do casamento.
Existe mentira melhor e mais agradável do que esta…?